terça-feira, 29 de novembro de 2011

Seguir a Cristo

Custa-nos tanto compreender o ensinamento de Cristo! Custa-me tanto colocá-lo em prática! Vejo tantos exemplos, tantos santos, mártires e virgens e também famílias inteiras que sabem seguir Jesus e sinto que não posso aprender a fazer o mesmo. Vejo em mim apenas fraqueza e incapacidade, minha vontade é sempre frágil e inconstante, fortes as más inclinações de meu coração e eu fraco demais sempre pronto para cair.

Ouço Jesus mandando-me deixar tudo para trás e segui-Lo. Ouço Jesus mandando que eu não olhe para trás ao segui-Lo. Ouço Jesus mandando-me deixar para trás tudo, minha vida, meus amigos, minha família, riquezas, prazeres, meus planos e sonhos. Dei um passo e vejo-me aqui, mas sinto-me preso às mesmas cadeias do passado, sinto que olhei para trás e deixei-me prender por aqueles inimigos que nunca se cansam de me perseguir. Olho em volta e não vejo nada, nenhum consolo, nenhum alívio, vejo trevas, desilusão. Olho para mim e não vejo nada, nada de bom, nenhuma virtude, somente vício e pecado, maldade e melancolia. Deixo sair de mim este lamento tentando fazer que saiam o que trago com ele, lamento-me por minha fraqueza, por meus pecados, por minha fraca vontade, por meus medos, por minha inconstância.

Ouço de novo Jesus me mandando deixar tudo para trás e segui-Lo. Fá-lo-ei de novo? Devo fazê-lo, não posso esquivar-me da necessidade que livremente me impus. Lamentos, sempre os terei, mas a cada dia em menor número. O olhar presente, porém, sempre vê em tamanho maior o que mais perto está aos olhos e ao coração, e perto de mim está o mal que ainda tenho dentro de mim, maior que o passado, já distante e vencido. É grande meu inimigo, mesmo que talvez seja menor que os inimigos passados, mas é igualmente grande no tempo presente, enquanto está perto de meu coração. Porém vejo perto também o meu Cristo suspenso na Cruz, vejo-O elevado no madeiro sobre o Calvário, vejo-O erguido por mãos de homem sobre o altar. Ouço Sua voz me mandando segui-Lo. Fá-lo-ei de novo.

Ouço Sua voz e me arrependo dos erros de outrora, confesso a Ele meu pecado e Ele de novo me acolhe repetindo o chamado que no passado me fez. Enquanto faz Ele memória de meu sacrifício, eu faço do Seu, ouvindo Sua voz me mandando segui-Lo. Sigo-O de novo, comendo Seu Corpo e bebendo Seu Sangue em Sua memória.

Custa-nos tanto compreender o ensinamento de Cristo! Custa-me tanto colocá-lo em prática! A mim custa tudo e tudo sacrifico assim, outro tudo recebo de Deus e o sacrifício já não me é impossível.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Ressurreição

Queria encontrar um tempo de solidão, estar a sós comigo mesmo, com meus pensamentos e memórias, meus pesares e alegrias. Ali encontraria alento, certamente, se a esta calmaria pudesse chegar, mas tantas vezes desejo que isto me venha sem esforço, espero apenas, passivo diante das possibilidades que tenho, e meu desejo se frustra, nas tentativas várias que faço de por mim mesmo frustrar a possibilidade que chega sem esforço de minha parte. Sou contradição, fujo de mim querendo encontrar-me, e encontro-me querendo fugir de mim, quase sem pensar, como movimento involuntário que vejo alcançar-me e não tento contê-lo, permaneço passivo como passivo espero algum momento de solidão.

Surpreendo-me, então. Encontra-me Deus sem que eu O chame para perto de mim, sem que eu O espere chegar, sem que eu O deseje encontrar, tantas vezes. Vou até o lugar onde Ele me espera, é certo, mas sem muita vontade de vê-Lo por lá. Quisera estar a sós comigo mesmo e ali imaginava que poderia fugir da companhia de outros homens e estar sozinho, mas encontro na minha solidão uma outra companhia que jamais poderia furtar-se da minha. Vejo-O em meu coração, em toda parte, em todo movimento, em cada desejo que tenho, mesmo que seja contrário àquilo que Ele quer para mim: minha consciência não me deixa mentir. Olho o altar, então, e o vejo vazio, ao fundo um crucifixo, o tabernáculo e a lembrança do que me ensina a Igreja quando vejo aquela pequena luz vermelha acesa: Ele está em nosso meio. Já não posso querer apagar a lembrança de que Ele está sempre perto de mim, não posso estar a sós comigo mesmo sem tê-Lo por perto. Minha solidão já não pode subsistir, mesmo se fujo de qualquer companhia, meu Jesus está perto de mim. Olho o sacrário e tento imaginar o Cristo que ali se esconde, tentando esconder-me também ali, na paz silênciosa daquele pequeno espaço onde meu Deus resolveu se esconder para poder encontrar-me, surpreender-me quando tento fugir de tudo que me cerca e perturba. Encontro ali o coração de meu Jesus, aquele sinal que me recorda Sua presença, sinal que me faz tocar com meus sentidos o mesmo mistério que me faz recordar. Não somente me lembro, também me aproximo e posso tocar, saudade torna-se encontro, solidão torna-se comunhão, sofrimento torna-se sacrifício e minha morte, ressurreição.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Sacramento

Vejo-Te no Sacramento e não cabe
Dentro de mim o entendimento
Nem tampouco o gozo que me invade
Sem que eu faça de minha parte
Qualquer esforço ou movimento

Vês-me no Sacramento e não posso
Esquivar-me de Teu olhar e vontade
De ter-me aqui sempre perto de Ti
E estares assim sempre perto de mim
Para ter-me para sempre perto de Ti

Encontro-Te no sacramento e não sei
O que fazes no segredo do que eu não
Conheço nem sequer poderia conceber
E recebo dentro de mim o Amor que
Gerou o meu ser e me fez como sou

Encontras-me no sacramento e não posso
Jamais poderia merecer ter-Te perto
Nem tampouco assim tão perto, dentro
De meu corpo como alimento e unido
Totalmente agora a meu próprio ser

Comunhão, mistério que não posso querer
Mas quero com todo meu ser e não posso
E posso com minhas próprias mãos alcançar
E assim posso inteiro ter-Te inteiro comigo
Aquele que consigo me quer para sempre

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Amai a Jesus

"O Verbo fez-se carne e habitou entre nós" (Jo 1, 14). Isto cremos e isto professamos solenemente a cada Santa Missa no dia do Senhor. O Verbo fez-se carne, quis viver entre nós, cresceu no seio de uma família, teve uma profissão, fez amigos, chorou, alegrou-se, foi a funerais, a festas, participou das alegrias e dores das pessoas de seu tempo. Essas amizades eram muito caras para Jesus, Ele amava profundamente seus amigos e era também profundamente amado por seus amigos. Estes não queriam que Jesus se afastasse deles, e tampouco Jesus queria isso. Quando anunciava a paixão, à qual sabia que devia se submeter, era logo repreendido por seus amigos mais íntimos. Ninguém queria pensar que Jesus morreria um dia, e muito menos de maneira tão cruel. Mas assim se fez.

Jesus, porém, pressentindo a saudade, chorando já às vesperas da paixão a dolorosa despedida, a saudade que sentia já e que deixava no coração de seus amigos, resolveu ficar e decidiu partir. Instituiu o sacramento de Sua Paixão, deixou-se sobre o altar e partiu para o calvário, mistério que significou o sacramento que deixara. Ali Jesus, tendo partido para o Pai, permaneceu entre nós também. Num gesto venceu a morte, matou a saudade e para nós perpetuou Sua companhia. Permanecendo lá no Céu, fez Céu também da Terra, para que onde Ele estivesse estivéssemos também nós (cf. Jo 12, 26).

Amai a Jesus, buscai Jesus Sacramentado, exorto-vos todos, amados irmãos. Pudesse eu levar a todos a companhia preciosa do Senhor, oferecer já a todos como alimento os Sacratíssimos corpo e sangue de nosso Deus e Senhor Jesus Cristo, eu o faria sem descanso, feliz por fazer cumprir-se o desejo de meu amigo divino, que mandou seus amigos tomarem seu Corpo e seu Sangue em sua memória para que O tivessem sempre por perto. Se o cremos encarnado, se o desejamos a cuidar-nos, porque não o buscamos, porque não o procuramos, porque não o desejamos?

Se não posso levá-Lo assim até vós, tentarei levar-vos a Ele, com umas poucas palavras, pequenos gestos ou simples exemplos, transmitindo-vos tudo que Ele me manda dizer-vos. Amai Jesus, buscai-O na Eucaristia, e nunca deixareis de encontrá-Lo.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Naquela Noite

Era uma noite fria, diferente das outras. Noite de Páscoa, nós reunidos para a ceia, e no meu coração uma alegria presa querendo a todo custo sair. Olhavas profundamente em nossos olhos, como se quisesses ver um pouco mais de nós que nossos rostos, e naquele olhar eu já podia ver a saudade que nos esperava. Tive a impressão de ver umas poucas lágrimas descerem pelo teu rosto, mas não tive coragem de dizer nada. Esperei que nos falasses do que se passava no teu coração, as razões da saudade, do choro, do frio e do Teu ardente desejo de comer aquela Páscoa conosco. Sempre nos falavas do Teu coração, mas naquela noite foi diferente, deixaste que Teu coração mesmo nos falasse. Disseste palavras cheias de mistério que alcançaram meu coração como nenhuma outra dita por ti. Tomamos a ceia.

Ainda hoje não compreendo bem o que aconteceu naquela noite. Tanto medo, tanto choro, tantos gritos e eu, mudo, me escondi. Sei que não poderia ter feito muita coisa, e sei também que tiraste proveito de minha fuga e me deste viver um pouco mais para poder estar contigo de novo, no fim do caminho que ora começava. Durante o caminho até o Calvário não conseguia pensar em outra coisa senão naquela ceia, enquanto via o Senhor ser arrastado pelas ruas da cidade como um criminoso.

Não havia compreendido aquelas Tuas palavras de amor e mistério ditas naquela noite até que pude estar contigo ali, no alto do Calvário. Quanta dor, quanto sofrimento! Ouvi o Teu grito: "Pai, em Tuas mãos entrego o meu espírito." Num ímpeto de uma dor que não podia conter por ver-Te partir, abracei os Teus pés e beijei-os e logo que Teu sangue tocou meus lábios senti meu coração arder e em minha alma uma paz que não posso descrever. Foi quando entendi o mistério daquela noite, a Ação de Graças que celebravas conosco naquela Páscoa. Ao Teu sangue misturavam-se minhas lágrimas, à Tua morte a minha vida.

sábado, 16 de abril de 2011

Teu Amor

Estava próximo o dia da Páscoa. Noite que jamais seria esquecida, bem aventurada noite que pôde resumir Tua história, a Boa Nova que por toda a Tua vida anunciaste e da eternidade nos fez todos participar. Noite diferente das outras noites. Tu, sabendo o que depois daquela hora sofrerias, pressentindo a despedida e a saudade que ficaria em Teu lugar, trataste logo de nos deixar uma lembrança, memorial de Tua vida e daquela hora, das horas que viriam. E muito mais que uma lembrança nos deixaste! Ali já vencias a morte e suas armas e nossa alma preparavas para Tua despedida. Quiseste ficar conosco depois de partir, partindo com Teus irmãos o pão que era Teu corpo, bebendo aquele vinho com Teus amigos, vinho que à Tua Palavra Teu sangue se tornara, voz que a tudo criou e ali recriava, Verbo Eterno que a tudo renovas.

Eis a nova vida, eis o Sangue que a tudo purifica, que afastou de nossas casas a morte que nos rondava! Eis a carne que nesta Pásca nos há de alimentar, eis a festa da liberdade dos antigos cativos de Judá! Preparas com Tua Palavra nosso coração para receber-Te. Tu nos recordas Tuas histórias, Tuas passagens por nossa história, nos falas de quem Te amava, também daqueles que à Tua Palavra não quiseram ouvir. Apresentas à nossa escolha a Tua escolha, Tua vida, Tua morte. Diante de nós colocaste a vida e a verdade, e um único caminho. Ouvimos atrás de nós aquele que nos diz: "este é o caminho, tomai-o" (cf. Is 30, 21) e diante de nós vemos a Cruz sobre o calvário. Eis o caminho, a verdade e a vida (Jo 14, 6)

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Tua Paixão

É difícil dizer o que senti quando Te vi ferido, golpeado por carrascos que não viam Teu amor, que se esqueceram de olhar teus olhos e ficar em silêncio na Tua companhia. Fico pensando no que sentiu Tua mãe ao ver-Te daquele jeito e ela, imobilizada, só podia sofrer em silêncio. O silêncio reinava naquele lugar, embora os gritos da multidão, dos carrascos e de teus temerosos seguidores tomassem os ares. O silêncio nos constrangia e nos compungia, Tu não dizias nada, não gemias, não gritavas e sequer Te deixavas vencer por tantos golpes.

É difícil dizer o que senti quando foste levado, eu esperava reencontrar-Te saindo dali para poder sarar Tuas tantas feridas, mas não pude. Voltei ao pátio do palácio e ali foste outra vez apresentado à multidão. "Eis o homem", dizia Pilatos, e a multidão enfurecida gritava para que fosses crucificado. Estavas vestido de rei e coroado de espinhos, mas Te condenaram a morrer na cruz, mesmo tendo sido flagelado. É difícil dizer o que senti quando foste condenado à crucificação. Segui-Te por todo o caminho, vi Tuas quedas, Teu rosto por terra sob o peso daquele patíbulo e Tua vontade de seguir até o final; e Tu permanecias em silêncio. Era chegada a hora do filho do homem ser levantado da terra e três cravos puderam prender-Te ao madeiro da cruz. Teu sangue vertia abundantemente e caindo no chão fez do calvário o lugar mais santo da terra. Ali quem Te amava fez silêncio contigo, já não havia esperanças de revogar Tua condenação, não era mais possível provar Tua inocência e morreste culpado, culpado de ser pobre, culpado de ser homem, culpado de ser Deus, culpado de muito amar.

Porém, tanto amor não poderia compreender o homem se pela morte não fosse provado. Hoje vejo que estar ali foi o maior dom que me fizeste, ver-Te morrer meu maior presente e cada vez que Te vejo outra vez elevado da terra, como no calvário, sinto aquele mesmo desejo de seguir-Te até o final. Quem poderia crer em tão grande amor se o Filho do Homem não fosse entregue nas mãos dos pecadores, se Ele não perdoasse a esses mesmos pecadores no auge do suplício que lhe infligiram? Quem o poderia crer se o Filho do Homem não tivesse desejado ardentemente comer essa Páscoa e permitir que aquele mesmo sacrifício que teve lugar no Calvário pudesse, pelas mãos de homens pecadores, ter lugar também sobre nossos altares e no coração de todo aquele que com as disposições convenientes come Seu Corpo e bebe Seu Sangue sacramentados?

Tua morte tornou-se-me a vida, minha vida valeu Tua morte e em minha morte me dás Tua vida.